40 anos da Pastoral do Dízimo na Igreja do Brasil
A prática de entregar o dízimo não é nova. E quando visitamos sua história, seja nos relatos de historiadores ou na Sagrada Escritura, notamos que a cada tempo assume características e funções diferentes, visando suprir as exigências da realidade social e religiosa da época.
Que necessidades do mundo moderno provocam mudanças que afetam a fisionomia da prática solidária do dízimo? Primeiramente, para reconhecermos os novos traços nessa fisionomia, precisamos conhecer sua face em outros tempos. Vejamos de modo breve:
Os Sumérios: Dispunham o dízimo de toda produção sobre um altar, com o intuito de aplacar a fúria dos deuses e buscando deles benefícios para o próximo ciclo de plantio e colheita.
Patriarcas: Abraão entrega a Melquisedeque a décima parte do espólio conquistado em guerra no Vale dos Reis. (Gn 14). Seu Filho Isaac, apesar de erguer altares, não há registro de que tenha realizado tal prática, ou mesmo que o tenha feito com seu pai Abraão. Jacó, filho de Isaac e neto de Abraão, certa feita, diante do medo de atravessar o caminho de seu irmão Esaú, dentre os preparativos para viagem, faz um pacto com Deus: Dar o dízimo de seu rebanho caso Deus o conduzisse em segurança por tal viagem.
No Egito: Durante o período de escravidão não há relato da prática de dizimar. Ocorrendo apenas quando da organização do povo em sua libertação.
Lei mosaica: O Dízimo, que até então era livre e sem destinatário, assume caráter de lei, com rigidez na quantia e presença de destino e tutor. Doravante os dízimos eram entregues aos levitas, que tinham a responsabilidade de cuidar dos estrangeiros, órfãos e viúvas. E tudo era consagrado ao Senhor. (Lev. 27,30)
Reinado de Israel: Após assentamento das tribos, o dízimo passou a ser cobrado também sobre as colheitas e em dois momentos, o dízimo ao templo e o dízimo aos pobres. Dos grãos e animais, e dos azeites e vinhos. Os recursos alocados mantinham o templo e os sacerdotes, bem como auxiliava na manutenção dos mais empobrecidos das comunidades. Permaneceu como lei durante muitos séculos.
Em Jesus, a Lei ganha o vigor da Graça. A experiência de amor proclamada por Jesus foi tão impactante que as primeiras comunidades colocavam tudo em comum.
E segundo o livro Atos dos Apóstolos, administravam de modo a não faltar nada a nenhum deles. Jesus ampliou a maneira de se viver tal prática. Não bastava a fidelidade na quantia, mas no modo com que se entregavam a Deus, os dízimos e outras ofertas. (Mt 23,23)
As primeiras comunidades sofreram, durante mais de 300 anos, duras perseguições, causando a prisão e a morte de muitos cristãos. Segundo historiadores, foi na fração do pão, na perseverança do ensino aos apóstolos e no ato de colocar tudo em comum, que as primeiras comunidades encontraram forças suficientes para permanecerem firmes no anúncio da Boa nova. Até que, a partir do ano 312, sob o poder do imperador Constantino, uma mudança radical propiciará a expansão do cristianismo e, ao mesmo tempo, no enfraquecimento das convicções cristãs. O dízimo, outrora vivido pelos pobres, é agora uma prática exercida pela nobreza. Contudo, estes se achavam no direito de interferir nos afazeres da Igreja.
A Igreja Católica institucionalizou a cobrança no Sínodo de Mâcon, em 585, estabelecendo a quantia de 10% das posses dos fiéis, passivo de excomunhão quando não entregue. A prática ganhou força com Carlos Magno: conforme alargava seu império no século IX, difundia a cobrança nas regiões conquistadas. Com o tempo, os governos entraram na jogada. “A Igreja permitiu aos reis cobrarem o dízimo, mediante o compromisso de expandirem a fé cristã”, diz Diego Omar Silveira, historiador da UFMG. Não tardou para que a má administração e a usurpação do poder esvaziassem de sentido e significado a prática de entregar os dízimos. Somente após o século XVIII, com a separação entre Igreja e Estado, é que o dízimo voltou a ser apenas de caráter religioso. Mas haveria de ser reconquistado no coração dos fiéis que, exauridos do antitestemunho, foram abandonando tal prática.
Os Bispos do Brasil, através do Estudo No 8, de 1974, lançaram um desafio ousado aos fiéis católicos: prover as necessidades da Igreja através da participação consciente e responsável de cada fiel. E mais, a gestão destes recursos não seria exclusiva do clero, mas teria a participação dos leigos. Ressurge a prática do dízimo sob novas bases. A primeira delas: que fosse por meio de uma pastoral organizada, catequética e administrativa.
Quarenta anos se passaram, e a Pastoral do Dízimo é uma grata realidade na Igreja do Brasil. Entramos no novo milênio com maior independência com relação à Igreja europeia, que durante anos assumiu a construção patrimonial bem como a formação de nossos padres e leigos. A Pastoral é presença em 100% das dioceses, em mais de 70% das paróquias. Aos poucos notamos que a opção pelo Dízimo como modo de autossustentação das comunidades, vem substituindo o sistema de taxas, diminuindo a quantidade de eventos como: rifas, bingos, leilões entre outros e inserindo os fiéis nos processos administrativos. Seguindo a orientação da Igreja em seu quinto mandamento, não há um valor percentual estipulado ou obrigatório, é uma prática espontânea e sistemática cuja espiritualidade se firma em São Paulo quando diz: Não dê de má vontade ou constrangido, pois Deus ama a quem dá com alegria. (II Cor. 9,8)
Ainda temos um longo caminho a percorrer. Não tenho dúvidas disso. Mas como missionário que acompanha nos últimos vinte e cinco anos, o crescimento desta pastoral, também não tenho receio algum em afirmar que: A Igreja do Brasil está preparada para exportar conhecimento sobre esta pastoral para todos os continentes.
Não apenas por sua eficácia e eficiência na alocação de recursos, mas pelo poder de reunir a família cristã em prol do bem comum.
Celebrando seus quarenta anos, representando os agentes da pastoral do dízimo espalhada por este país imenso, agradecemos à proposta lançada pela CNBB e pelo apoio que por certo ainda continuaremos a ter por parte dos senhores bispos e padres.
Aos agentes desta pastoral, desejo a força do Espírito e o vigor da fé encarnada.
Aristides Luís Madureira (aristides@editoraapartilha.com.br)
Formação em comunicação (Produção e direção de mídia eletrônica TV), graduado em Processos Gerenciais. Missionário leigo há mais de 25 anos. Sócio diretor da editora católica A Partilha. Autor de dezenas de livros, dentre elas destacam-se: Pastoral da Partilha Manutenção; Partilhando a Vida em Família; Dízimo em 30 segundos; Princípios Básicos do Secretariado Paroquial; Catequese: Como promover o Encontro das Novas Gerações com Jesus; O poder da Comunicação no Secretariado Paroquial.