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“EVANGELIZAR EM TEMPO DE “DESCONSTRUÇÃO”

“EVANGELIZAR EM TEMPO DE “DESCONSTRUÇÃO”

 Dom Edson Oriolo¹

Nesse tempo da contemporaneidade temos que usar todos os recursos para vivenciar e proclamar a Palavra de Deus. É o anúncio da Boa-Nova que junta os fiéis (cf. LG 26; PO 4) na dinâmica da Igreja doméstica e, por isso temos que ser ousados e criativos na evangelização. Eis a sublime missão da Igreja. A origem e o princípio da comunidade eclesial missionária, que tem como centro e ponto culminante a Eucaristia (cf.EE 3), é a Palavra de Deus anunciada, escutada, meditada e encarnada na vida das pessoas. Estamos vivendo numa sociedade em “desconstrução” que muito necessita da proclamação da Palavra de Deus. Na carta Fratelli Tutti, Francisco usa essa expressão: “desconstrucionismo” (cf. FT 13). Um movimento intelectual da década de 60 que procurou desfazer as verdades vinculadas à tradição, tendo como fundamento uma concepção pluralista. Esse movimento vem ganhando espaço com o avanço da tecnologia vivenciada nas redes sociais, na era cibernética. Na perspectiva do papa Francisco, essa penetração cultural do desconstrucionismo, em que a liberdade humana pretende construir tudo a partir do zero, “é uma nova forma de colonização cultural. Uma maneira eficaz de dissolver a consciência histórica, o pensamento crítico, o empenho pela justiça e os percursos de integração. Um esvaziar de sentido ou manipular as grandes palavras” (FT 14). A doutrina Breitbart, liderada por Steve Bannon, assessor político que auxiliou o ex-presidente Donald Trump, ensinava que “se alguém quiser mudar a base de uma sociedade precisa destruí-la e só quando destruí-la poderá remoldar seus pedaços através de uma visão de uma nova sociedade”. Para criar uma cultura de guerra necessitamos de banco de dados. No entanto, pelas redes sociais conseguimos obter dados. Os algoritmos ajudam focar nas pessoas com personalidades e construir um perfil psicológico. Essa metodologia mexe com o processo democrático. Vão atingindo o que querem. Isso passa a ser uma penetração cultural do desconstrucionismo. Todos nós temos plena ciência de que quando criamos uma metodologia de ódio acabamos gerando ódio e mais ódio e a partir daí surgem conflitos, guerras, desavenças etc. Atualmente, podemos perceber que as redes sociais, além de serem uma ferramenta de informação e relacionamento, produzem por outro lado, através dos algoritmos e bolhas digitais, muito ódio, intriga, guerra, desunião, principalmente pelas fakes News e pós-verdade. Frente a essa realidade, o papa Francisco, de maneira sutil, vem falar na Fratelli Tutti que não podemos desprezar a história e nem rejeitar a riqueza espiritual e humana que foi transmitida através das gerações, ignorando tudo quanto nos precedeu, desfazendo-nos de questões tradicionais (cf FT 13). Acredito que uma maneira para rever essa cultura do desconstrucionismo é atingir o maior número possível de pessoas com a Palavra de Deus, o avivamento de nossas comunidades eclesiais missionárias, tornando-as mais ousadas, criativas e visionárias.

São Paulo andou a pé e de barco para lançar a Palavra de Deus, são João Paulo II, Bento XVI e o Papa Francisco de avião e nós podemos usar o rádio, a televisão, a internet, as redes sociais para aproximar as pessoas de Deus e fortalecer as nossas comunidades paroquiais missionárias. Dado o exposto, o Sumo Pontífice apresenta uma visão que implica novos comportamentos pastorais e que se apresenta também uma resposta ao desconstrucionismo. Francisco sinaliza que não se pode ignorar o risco de acabarmos vítimas de uma esclerose cultural (cf. FT, 134). O papa ainda sugere a necessidade “de se manter um diálogo confiante e paciente, para que seja transmitidos os valores da própria cultura e que haja o acolhimento das experiências alheias” (FT, 134). Nesse sentido, ele impele a uma nova visão do futuro, com esperança e sensatez, superando a unicidade de percepções, promovendo uma amplitude de visões. Assim afirma Francisco: “com efeito, o futuro não é monocromático, mas – se tivermos coragem para isso – podemos contemplá-lo na variedade e na diversidade das contribuições que cada um pode dar. Como a família humana precisa aprender a viver conjuntamente, em harmonia e paz e sem necessidade de sermos todos iguais!” (FT, 100). O papa ainda utiliza outra metáfora para superar uma hermenêutica unívoca, mas alargar os horizontes de possibilidades, Francisco fala do poliedro. Pensa essa figura como uma tradução de soluções práticas à fragilidade das relações e interpretações reduzidas. Nesse aspecto, afirma: “a base adquirida a partir da experiência da vida transcorrida em certo lugar e em determinada cultura é o que torna uma pessoa capaz de apreender aspectos da realidade que não conseguem entender tão facilmente aqueles que não possuem tal experiência. O universal não deve ser o domínio homogêneo, uniforme e padronizado de uma única forma cultural imperante, que perderá as cores do poliedro e ficará enfadonho” (FT, 144). Segue-se a isso a seguinte proposição do Romano Pontífice: “em todo caso, é preciso alargar sempre o olhar para reconhecer um bem maior que trará benefícios a todos nós. Mas há que o fazer sem se evadir nem se desenraizar. É necessário mergulhar as raízes na terra fértil e na história do próprio lugar, que é dom de Deus. Trabalha-se no pequeno, no que está próximo, mas com uma perspectiva mais ampla. (…). Não é a esfera global que aniquila, nem a parte isolada que esteriza. É o poliedro em que, ao mesmo tempo que cada um é respeitado no seu valor, o todo é mais que a parte, sendo também mais do que a simples soma deles” (FT,145). Com efeito, a proposta pastoral do santo padre corresponde às necessidades da evangelização, sua sensibilidade encontra resposta nos anseios da dinâmica pastoral atual. Sendo assim, permite-se, de fato, entender que o foco da evangelização é a comunidade que vive, testemunha e anuncia a boa-nova. Assim agiu Jesus, assim devem agir seus discípulos.

 

¹Bispo da Igreja Particular de Leopoldina MG