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CENÁCULO, O ANDAR DE CIMA

CENÁCULO, O ANDAR DE CIMA

Uma das cenas mais marcantes da última visita do papa à Terra Santa se deu numa sala especial, onde “nasceu a Igreja”, diria Francisco. “… e nasceu em saída. Daqui partiu com o Pão repartido”, acrescentou em seu sermão. Que ambiente era esse, tão especial, capaz de provocar declarações sucintas e de valor histórico comprometedor? Aqui nasceu a Igreja, mas já a caminho, saindo, se comprometendo, assumindo sua missionariedade! Uma sala qualquer, como tantas, mas especial, escolhida a dedo. Um ambiente santo, um andar acima, certamente conhecido por Jesus.

Chegava a Páscoa, a maior de todas! Tão especial que Jesus exigiu uma preparação meticulosa. “Onde queres que a preparemos?” – era a preocupação dos apóstolos. A resposta foi detalhista: “Ao entrardes na cidade, encontrareis um homem carregando uma bilha de água; segui-o até à casa em que ele entrar, e direis ao dono da casa: O Mestre pergunta-te: Onde está a sala em que comerei a Páscoa com os meus discípulos? Ele vos mostrará no andar superior uma grande sala mobiliada, e ali fazei os preparativos” (Lc 22, 9-12). Então foram. Encontraram tudo conforme predissera Jesus. Encontraram a misteriosa sala que foi cenário (daí seu nome, cenáculo; sala da ceia) de dois grandiosos mistérios do cristianismo: o milagre eucarístico e a difusão do Espírito.

Sim, foi esse ambiente a incubadora da Igreja. Primeiro no gesto de serviço, quando Jesus ali recebeu seus discípulos como se os recebesse em sua própria casa, a ponto de exercer pessoalmente o ritual do lava-pés. Igreja é comunidade de serviço… Depois no ritual do sacrifício, quando um aparente banquete se torna símbolo da doação total… É Jesus que se oferece por nós ao Pai. Igreja é pão repartido, que parte, reparte… Depois, nos momentos de dor e perseguição, tornou-se o refúgio, a sala de apoio mútuo, com Maria entre eles. Igreja é a Casa Paterna, onde Maria também reina e conforta… Por fim, era lá que buscavam forças: “Tendo entrado no cenáculo, subiram ao quarto de cima, onde costumavam permanecer” (At 1,13). Então, era ou não um local abençoado?

A prova veio quarenta dias depois daquela fatídica Páscoa. “Chegando o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar (ao redor daquela mesa, naquela mesma sala). De repente veio do céu um ruído, com se soprasse um vento impetuoso”… (At 2, 1-2). O mesmo cenário do banquete, do pão que se tornou carne, da vinho feito sangue, da dor, da perseguição, do amparo de Maria, da consolação, agora se tornava cenário da Fé plena, audaciosa, sem barreiras, sem fronteiras. Por isso, nos disse o papa Francisco: “aqui a Igreja nasceu em saída”. Pronta, destemida, renovada em seu ardor missionário, ungida pelo Espírito Santo de Deus! O milagre de Pentecostes completou o milagre da mesa redentora, coroou o altar eucarístico.

“Quanto amor, quanto bem brotou do Cenáculo. Quanta caridade saiu daqui, como um rio da nascente, que no início é apenas um riacho, mas depois se alarga e torna-se imenso”, completou Francisco. Então é isso: a Igreja nasceu um andar acima da realidade conflituosa que cerceia a humanidade; um degrau acima dos nossos dilemas e inseguranças. O cenário especial era quase um pedacinho do céu entre nós, a casa de Deus, os aposentos especiais como aqueles que nos aguardam no andar de cima. Daí a enxergarmos nossos templos de fé como pequenas células da casa de Deus, cenáculos miraculosos que nos acolhem, amparam, restauram nossas forças e nos enviam ou devolvem ao mundo, é o mínimo que se espera dum bom cristão. Porque Igreja-templo é também o local sagrado, o ponto de referência de que necessitamos para fazer brotar em nós a água-viva; a mesma água que irá saciar o coração humano e dará ao mundo a imensa alegria da revelação cristã. Igrejas, pequenos oásis entre nós!

“E o Senhor cada dia lhes ajuntava outros, que estavam a caminho da salvação”.

WAGNER PEDRO MENEZES
wagner@meac.com.br

Imagem: Canção Nova