Engajamento para uma Juventude rica de valores
“Felizes os que têm fome e sede da justiça, porque serão saciados” (Mt 5,6).
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), promulgado em 1990, durante a redemocratização do país e, mais tarde, implementado pelos governos Lula e, hoje, Dilma Rousseff, foi saudado como uma das melhores leis do mundo em relação às crianças e aos adolescentes e, com certeza, está na vanguarda no nosso Continente Latino – Americano. Hoje, o ECA é objeto de tentativa de redução da maioridade da idade penal: é um grande retrocesso político e jurídico. A redemocratização foi um momento muito importante para o Brasil: momento único, incrível, também, para os direitos da infância e do adolescente na história brasileira. Por mais grave que seja o delito, que tenha cometido, o jovem infrator é recuperável – é o espírito do ECA.
O ECA é exigente com o adolescente em conflito com a lei e não compactua com a impunidade. Ao afirmar a dignidade da criança e do adolescente e, colocando em foco o fato de que eles são sujeitos de direitos, impõe, ao mesmo tempo, sanções aos jovens infratores, dando ao juiz a possibilidade de estender a medida de privação da liberdade com a aplicação da semiliberdade e da liberdade assistida. A simples privação da liberdade, ainda mais em condições degradantes, não produz o efeito desejado de reeducação. A realidade penitenciaria no Brasil, e em várias partes do mundo, tem demostrado a falência da pena de prisão como meio de reintegração social. A crueldade com os infratores e a humilhação deles os leva a perder o respeito, não adquiri-lo.
O sistema carcerário brasileiro é considerado violenta e bárbaro, uma verdadeira “escola do crime”. Se você colocar um garoto de 16-18 anos nestas prisões, vai acabar condenando uma geração inteira, por não ter dado a ela uma oportunidade para se redimir. Excluir o adolescente da possibilidade de se reintegrar socialmente vai deixá-lo ainda mais nas malhas do crime organizado. É hipocrisia estar a favor do armamento da população e penalizar o jovem infratores por usar armas. A formula de “olho-por-olho e dente-por-dente” (Mt 5,38) é símbolo de revide e de vingança. As estatísticas falam claro: os números de casos de violência, cometidos contra os adolescentes, são bem mais altos do que aqueles praticados por eles.
Se aprovada a redução da maioridade penal, abre as portas para o desrespeito da criança e do adolescente, colocando em cheque a “Doutrina Proteção Integral”, assegurada pelo ECA. Poderá haver um “efeito dominó”, fazendo com que algumas violações aos direitos da criança e do adolescente deixem de ser crimes, como a venda de bebidas alcoólicas e abusos sexuais, dentre outros. A privação de liberdade, além de ser ineficaz, exige um alto custo para a sociedade. Abstraindo de toda questão jurídica, nós não estamos agravando o problema do sistema carcerário brasileiro? E pior, nós não estamos jogando adolescente num sistema, cujo retorno não tem sido um bem para a sociedade?
“A comoção não é boa conselheira e, nesse caso, pode levar a decisões equivocadas com danos irreparáveis para muitas crianças e adolescentes, incidindo diretamente nas famílias e na sociedade. O caminho para pôr fim à condenável violência, praticada por adolescentes, passa, antes de tudo, por ações preventivas como educação de qualidade em tempo integral; combate sistemático ao tráfico de drogas; proteção à família; criação, por parte dos poderes públicos e de nossas comunidades eclesiais, de espaços de convivência, visando a ocupação e a inclusão social de adolescentes e jovens por meio de lazer sadio e atividades educativas; reafirmação de valores como o amor, o perdão, a reconciliação, a responsabilidade e a paz” (CNBB).
A violência, mais do que um caso de polícia, é um fato social e de educação. A proposta de reduzir a imputabilidade é simplificadora e juridicamente inconstitucional, conforme a normativa internacional. A violência não é um ato isolado, próprio de uma idade ou de desvio de personalidade, mais é fruto de um sistema social corrupto, egoísta, pagão e idolátrico, que procura só o próprio lucro e interesse e quer acabar com a família. Indignemos, sim, mas contra a má gestão dos bens públicos e a falta de acesso à cultura e a formação das jovens gerações. Não fiquemos indiferente frente as grandes filas do SUS e ao precário atendimento da saúde pública…, à exploração dos bens do Brasil e à terceirização dos empregos. Engajemo-nos, sim, e decididamente, para formar uma juventude rica de valores humanos e espirituais.
Pe. Ernesto.